
Nova crise diplomática do governo brasileiro, dessa vez com a França, coloca em dúvida a possibilidade de assinatura do acordo de comércio entre Mercosul e União Europeia.
Com informações da AFP (França).
O presidente francês, Emmanuel Macron, acredita que seu contraparte brasileiro, Jair Bolsonaro, “mentiu” sobre seus compromissos com o meio ambiente e anunciou na sexta-feira (23/08) que, nessas condições, a França se opõe ao controverso tratado de livre comércio UE-Mercosul.
A presidência francesa declarou: “Dada a atitude do Brasil nas últimas semanas, o presidente da república não pode evitar constatar que o presidente Bolsonaro mentiu para ele na cúpula [do G20] de Osaka”, estimando que “o presidente Bolsonaro decidiu não respeitar seus compromissos climáticos nem se comprometer com a biodiversidade”. “Nestas circunstâncias, a França se opõe ao acordo do Mercosul”, conclui.
A mais recente crise diplomática brasileira, agora com a França, vem na esteira de atritos gerados com Noruega e Alemanha, também a respeito de questões ambientais. O ministro do Meio Ambiente brasileiro, Ricardo Salles, chegou a receber vaias em um encontro promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU) em Salvador.
Ontem (22/08) o presidente francês causou estardalhaço tanto em meio à opinião pública francesa quanto em meio à brasileira, após publicar no Twitter uma mensagem conclamando os demais países do G7 a colocarem na pauta de sua reunião o assunto das queimadas e incêndios florestais na Amazônia. O encontro do G7 ocorrerá entre 24 e 26 de Agosto, e já se encontrava marcado há meses.
Notre maison brûle. Littéralement. L’Amazonie, le poumon de notre planète qui produit 20% de notre oxygène, est en feu. C’est une crise internationale. Membres du G7, rendez-vous dans deux jours pour parler de cette urgence. #ActForTheAmazon pic.twitter.com/Og2SHvpR1P
— Emmanuel Macron (@EmmanuelMacron) August 22, 2019
A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, demonstrou apoio à proposta de Macron de incluir o tema da preservação da Amazônia no encontro do G7, qualificando o assunto como “urgente” através de comunicado de seu porta-voz. O primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, também concordou com Macron.
I couldn’t agree more, @EmmanuelMacron. We did lots of work to protect the environment at the #G7 last year in Charlevoix, & we need to continue this weekend. We need to #ActForTheAmazon & act for our planet — our kids & grandkids are counting on us. https://t.co/KwaR8Eevq5
— Justin Trudeau (@JustinTrudeau) August 23, 2019
Franceses que se opuseram à declaração de Macron o responderam com fotos da catedral de Notre-Dame em chamas e de protestos recentes em Paris. O presidente brasileiro afirmou que Macron demonstrava “mentalidade colonialista” ao interferir nos assuntos internos do Brasil, o que foi prontamente replicado pelos seus apoiadores. O general Eduardo Villas-Boas, ex-comandante do Exército Brasileiro (2015-2019) e, atualmente, assessor do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), afirmou que a França fez um ataque direto à soberania brasileira, inclusive com ameaça de uso de força militar (o que não estava presente nas declarações do presidente francês).
Com uma clareza dificilmente vista, estamos assistindo a mais um país europeu, dessa vez a França, por intermédio do seu presidente Macron, realizar ataques diretos à soberania brasileira, que inclui, objetivamente, ameaças de emprego do poder militar.
— General Villas Boas (@Gen_VillasBoas) August 23, 2019
É válido lembrar que o acordo entre Mercosul e União Europeia ainda depende de aprovação pelos parlamentos dos países-membros do Mercosul, algo que pode não ocorrer caso Alberto Fernández, o favorito a vencer as eleições argentinas, seja de fato eleito – Jair Bolsonaro, o presidente brasileiro, está ativamente tentando prejudicar a campanha de Fernández e promover Mauricio Macri, o segundo colocado e candidato à reeleição, o que já gerou alguns atritos.
Ainda não está claro o quanto os atritos entre Brasil, França, Noruega e Alemanha podem afetar o acordo de produção de caças militares estabelecido entre Brasil e Suécia, cujas primeiras unidades estavam previstas para entrar em operação ainda neste ano.
O G7 (ou “Grupo dos Sete”) é um grupo internacional composto por Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido, embora representantes da União Europeia também frequentem suas reuniões.
Atualização (23/08 às 10:41, horário de Brasília): O jornal português Público noticiou, com base em informações da Reuters, que o governo da Finlândia apelou à União Europeia para que o bloco considere a possibilidade de banir as importações de carne brasileira como resposta à devastação causada pelas chamas na floresta amazônica. A Irlanda também somou forças à França em relação à proposta de bloquear o acordo com o Mercosul. A Finlândia assume neste momento a presidência rotativa da União Europeia.
Atualização (23/08 às 16:00, horário de Brasília): O jornal brasileiro Valor Econômico informou que Jair Bolsonaro deve fazer um pronunciamento ainda hoje, sexta-feira, sobre a situação na Amazônia, provavelmente informando sobre o uso das forças armadas para o combate aos incêndios florestais. Boris Johnson, o primeiro-ministro britânico, também se manifestou favoravelmente à discussão sobre a Amazônia na reunião do G7. Com a manifestação de Johnson, já são quatro países favoráveis a incluir o tema nas pautas do G7, ou seja, a maioria do grupo.
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